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Sauvignon Blanc

por Ana Wingert

Uma das uvas brancas mais cultivadas no mundo, a Sauvignon Blanc produz vinhos com vários estilos, desde os mais frescos até os mais encorpados.

A estreante desta coluna com informações das principais castas do mundo é a tão conhecida Sauvignon Blanc, uva branca que tem muita história e é amplamente conhecida e apreciada pelos consumidores brasileiros, dada sua versatilidade, disponibilidade de rótulos no mercado e relação de valor versus qualidade.

A origem e os parentescos da Sauvignon Blanc

Ao contrário do que é comumente divulgado, é improvável que a Sauvignon Blanc tenha surgido em Bordeaux, onde foi mencionada pela primeira vez entre 1710 e 1720 na região de Margaux.

A sua origem seria mais plausível no Vale do Loire na França, onde sua primeira menção aparece sob o antigo sinônimo de Fiers em 1534, segundo François Rabelais no capítulo 25 de Gargantua.

Com o nome Sauvignon Fumé ou Blanc Fumé, foi descrita em Sancerre e Pouilly no Cher “département”, região central do Vale do Loire, onde ganhou estímulo nos últimos dois séculos.

Além da análise de parentesco do DNA, a origem no Loire também é suportada pela etimologia do nome Sauvignon, que provavelmente vem de “French Sauvage”, por causa do formato da folha similar a videiras selvagens. 

Outras hipóteses da sua origem

De acordo com Lavignac, o nome pode ter surgido de uma área Gália Romana, tal como a Sauvagnon em Béarn (antiga província francesa), ela mesma derivada de um nome pessoal, como Salvinius, Silvinius ou Salvanius.

O geneticista austríaco Ferdinand Regner reivindica que numa análise de parentesco de DNA existem evidências de um cruzamento entre a Chenin Blanc com a Savagnin, entretanto esta hipótese foi rejeitada em uma avaliação mais detalhada de 60 marcadores de DNA, na qual os resultados apresentaram 18 discrepâncias.

  • Principais sinônimos: Blanc Fumé ou Blanc Fumet (Sancerre e Pouilly no Vale do Loire), Fié ou Fiers (Sauvignon Gris/Rose no Vale do Loire e Vale de la Vienne), Fumé (Nièvre), Fumé Blanc (California), Muskat-Silvaner (Austria e Alemanha).
  • Variedades habitualmente confundidas com a Sauvignon Blanc: Ahumat (Jurançon), Sauvignonasse, Savagnin Blanc, Silvaner (Wurzel Silvaner na Áustria) e Spergola (Reggio Emilia na Itália).

Características da viticultura

A Sauvignon Blanc é uma casta que se adapta muito bem em uma grande variedade de solos e o seu amadurecimento é de precoce para médio. Tem muita vitalidade e necessita ser plantada em porta-enxerto de baixo vigor e em solos pobres de matéria orgânica, caso contrário a folhagem da planta pode ser quase incontrolável.

É pequena e arredondada, com tonalidade verde-clara, com grupos compactos de pequenas bagas que são altamente suscetíveis à podridão nobre através da Botrytis Cinerea, fungo que origina microfuros na casca da uva, secando-a e concentrando açúcar, aroma e sabor. 

Principais características da casta

A uva Sauvignon Blanc foi disseminada de forma acelerada em quase todo o mundo. O vinho produzido à partir dela é aromático, apresenta elevada acidez e, em sua maioria, tem corpo e intensidade leves. Por isso, via de regra, deve ser consumido ainda jovem, entre o primeiro e quarto ano da colheita.

O leque de aromas é geralmente associado à notas verdes – de ervas, folhas, urtigas, groselhas – quando são colhidas precocemente. Todavia, seus aromas dominantes são de frutas cítricas (em climas mais frios) e tropicais, como limão, toranja, maracujá e pêssego (em climas mais quentes), grama, notas verdes herbáceas e florais, além de notas minerais. Nos estilos mais opulentos podem ser encontrados aromas de maçã assada, cascas de laranja, gengibre, camomila e crème brûlée.

Curiosidade: no final do século 20, “xixi de gato” tornou-se uma descrição popular do aroma de alguns vinhos de Sauvignon Blanc colhida precocemente. De outro lado, os vinhos produzidos a partir de uvas muito maduras eram relativamente monótonos ou enfadonhos (chatos).

A origem da uva Sauvignon Blanc traz aromas particularmente distintos e a forma que são influenciados nos vinhedos, tempo de colheita e no processo de vinificação refletem diretamente na intensidade dos aromas verdeais e herbáceos. 

Regiões produtoras de destaque

Os melhores vinhos franceses elaborados com a casta Sauvignon Blanc são produzidos no Vale do Loire, região noroeste da França, mais especificamente em Pouilly-Fumé e Sancerre, sendo esta última região o sinônimo de referência e renome mundial da uva.

Sancerre – é a maior denominação de origem dos vinhedos centrais do Vale do Loire. O vilarejo de mesmo nome está situado a cerca de 200 quilômetros a leste de Tours e na mesma distância a oeste de Dijon. Devido à sua posição geográfica, conta com um clima semi-continental e uma grande amplitude térmica. Apesar de contar com solos predominantemente calcários, Sancerre apresenta três perfis distintos. Terres Blanches, com grande quantidade de fósseis de conchas marinhas, Caillotes (pedras maiores) ou Griottes (pedras menores), mais antigos e pedregosos, e por fim o Silex com rochas mais jovens, mas também de origem marinha.

  • Alguns produtores que merecem espaço na sua adega (nem todos importados ao Brasil): Bailly-Reverdy, Daniel Crochet, Domaine Merlin-Cherrier, Vincent Pinard, Clos la Néore, Hubert Brochard, Pascal Cotat, Domaine Vacheron, Gérard Boulay, Vincent Gaudry, Henry Natter, Domaine Laporte e Serge Laloue.

A Sauvignon Blanc geralmente é encontrada em vinhos varietais, mas muito difundida em Bordeaux, onde é misturada com as uvas Sémillon e Muscadelle para produção de vinhos doces e secos, os famosos Sautérnes.

Não é uma casta especialmente importante na Itália, mas Trentino-Alto Adige e Friuli-Venezia Giulia, com seus excelentes vinhos, são regiões para manter no seu radar. Cantina di Terlano, Colterenzio, Lis Neris, Tiefenbrunner, Villa Russiz e Vie di Romans entram nesta seleção. No Langhe o produtor Gaja tem um Sauvignon Blanc sensacional, o Alteni di Brassica. 

  • Na Califórnia a Sauvignon Blanc parece ter atingido o seu auge em 2010.

As maiores áreas estão em Sonoma, Napa e San Joaquin no Vale Central. A uva nestas regiões é notadamente “rica” e sofre mais que outras áreas do mundo, devido ao seu clima quente. Dry Creek Vineyard foi a primeira a vinícola a utilizar o termo “Fumé Blanc”, que foi adotado por Robert Mondavi no meio dos anos 70 e desde então ganhou fama mundial. Os vinhos californianos normalmente possuem passagem por madeira durante seu processo de elaboração.

  • Alguns produtores californianos de sucesso: Araujo, Benzinger Family, Brander Vineyard, Merry Edwards, Sbragia Family and Westerly Vineyards.

No Chile a Sauvignon Blanc tem uma história interessante. Com mais de 15 mil hectares de vinhedos, é a casta branca mais cultivada no país. A área de produção continua crescendo, predominantemente em Curicó, Maule e em maior velocidade no Vale de Casablanca.

  • A qualidade aumenta a cada ano e alguns produtores de excelência se destacam no norte de Santiago, dentre os quais Amayna, Montes, o Fournier, Viña Leyda e Viña Morandé, além de Casa Marin no Vale de San Antonio, Casa Silva e Laberinto no Maule.

Na Austrália a Sauvignon Blanc está entre as três castas mais plantadas, mas somente nos anos mais recentes começou a ganhar popularidade. Observe os vinhos de Adelaide Hills (Shaw and Smith), Coonawarra (Conquest Wines), Yarra Valley (De Bortoli Phi), Western Australia (Cape Mentelle, Larry Cherubino e Cullen) e Tasmania (Domaine A). 

  • Fora da sua região de origem, é na Nova Zelândia que a Sauvignon Blanc reina.

Os produtores locais gostam de sugerir que é a “casa” da casta, apesar do histórico tão curto. Primeiramente plantada em 1970, teve um extraordinário crescimento nas últimas décadas, especialmente em Marlborough, responsável por 3/4 da produção de todos os vinhos. O terroir marítimo, o solo arenoso e as grandes altitudes ajudam a desenvolver uma excelente acidez e uma grande variedade de aromas.

Alta produção, baixos custos com barricas de madeira, curto espaço de tempo para colheita e o sucesso global de Cloudy Bay (hoje do grupo Moet Hennessy), fizeram a casta a mais atrativa. Hoje, o país oceânico é o segundo maior produtor da cepa, com pouco mais de 20 mil hectares plantados. Os estilos dominantes não passam por madeira, apresentam forte presença de fruta e são para serem consumidos de imediato.

  • Vale conhecer: Black Canvas, Clos Henri, Dog Point, Isabel Estate, Seresin, Spy Valley e Palliser.

O destaque para a vinificação da casta Sauvignon Blanc na Nova Zelândia ocorre atualmente por conta da técnica criada pelos enólogos do país, que conseguem colher a uva em diferentes estágios de amadurecimento, obtendo bastante corpo. Graças a essa moderna técnica, os vinhos são complexos, com grande presença de aromas minerais e notas de flores.

África do Sul também é uma área importante para a Sauvignon Blanc. Com frutas um pouco menos pronunciadas e a influência da fria corrente marítima de Benguela, vinda da Antártida, produz vinhos mais refrescantes.

  • Ótimos produtores para ter na lista: Kaapzicht, Mulderbosch, Vergelegen, Waterkloof, Klein Constantia, Cape Point Vineyards e Fryer’s Cove.

No Brasil, a cepa tem se adaptado muito bem na Serra Catarinense, o que fez com que muitos enólogos investissem em rótulos da uva nos últimos anos. O terroir tem uma série de similaridades com o da Nova Zelândia e, além disso, Santa Catarina se destaca pela produção de excelentes vinhos de altitude. A região, inclusive, recebeu o selo de Indicação Geográfica (IG) em 2020. 

  • Vivalti Sauvignon Blanc (São Joaquim/SC), Under my Skin (Monte Alegre/RS), Parole di Famiglia (Serra Gaúcha/RS), Sopra e Sozo (Campos de Cima da Serra/RS), Thera (Bom Retiro/SC) são excelentes rótulos e produtores para você conhecer.  

Harmonização clássica com Sauvignon Blanc

Queijos de cabra, tais como Chabichou du Poutou, Crottin de Chevignol ou o Valençay. Também acompanham queijos pastosos, estilo Boursin, além de Mozzarella de búfala, ricota e feta.

Outras harmonizações ideais: pratos leves e menos gordurosos, peixes e frutos do mar em preparações cítricas ou com ervas, ceviche, guacamole, moqueca, saladas de folhas e frutas, pratos vegetarianos, vinagretes, ervilhas, brócolis, couve-flor e aspargos. Risoto de alho-poró e frituras por imersão.

Curiosidade

 A Sauvignon Blanc viajou do Vale do Loire até a região onde está localizado o estuário do Gironde (Bordeaux) e, de forma espontânea, cruzou com a Cabernet Franc, dando origem a uva que atualmente é a mais plantada no mundo: a Cabernet Sauvignon.

Por Olavo Castanha

Olavo Castanha é formado em Marketing e atua no mercado de bens de consumo há 30 anos. Formado em Enogastronomia pela ICIF – Italian Culinary Institute for Foreigners e Sommelier pela Associação Brasileira de Sommeliers – SP, atualmente se prepara para a próxima fase da Court of Master Sommeliers Americas.

  • Texto publicado com autorização do autor.
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