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Vinho do Porto

por Ana Wingert

O Porto é um vinho fortificado produzido a partir de uvas cultivadas no Douro, no norte de Portugal. Tem longa história e tradição e é apreciado há séculos nos quatro cantos do planeta, especialmente pelos britânicos. 

Você pode até pensar que o Vinho do Porto só pode ser servido com sobremesa, mas este vinho fortificado vai muito além da sua reputação de final doce do jantar.

Conheça, então, como o Vinho do Porto é produzido e quais suas características principais.

História do Vinho do Porto

O Vinho do Porto tem o nome da cidade portuária do Porto, na região do Douro, que se tornou denominação oficial em 1756 – a terceira região regulamentada mais antiga da Europa e a primeira demarcada no mundo.

Todavia, a cultura da uva e a produção de vinho em Portugal, e especificamente no Vale do Douro, começaram milhares de anos antes.

As uvas são cultivadas em Portugal desde a antiguidade. Os escritos de Estrabão, o grande geógrafo da Grécia antiga, indicam que os habitantes do noroeste da Península Ibérica já bebiam vinho há dois mil anos. 

Os romanos, que chegaram a Portugal no século II a.C. e permaneceram mais de quinhentos anos, cultivavam vinha e faziam vinho nas margens do rio Douro. O período de prosperidade que se seguiu ao estabelecimento do Reino de Portugal em 1143 viu o vinho tornar-se um importante produto de exportação.

No entanto, o surgimento do Vinho do Porto, tal como o conhecemos, ocorreu muito mais tarde. Os primeiros vinhos conhecidos com este nome foram exportados apenas na segunda metade do século XVII.

Em 1386, o Tratado de Windsor estabeleceu uma estreita aliança política, militar e comercial entre a Inglaterra e Portugal. Nos termos do tratado, cada país concedia aos comerciantes do outro o direito de residir no seu território e de negociar em igualdade de condições com os seus próprios súditos.

Desenvolveram-se relações comerciais fortes e ativas entre os dois países e muitos comerciantes ingleses estabeleceram-se em Portugal. Na segunda metade do século XV, quantidade significativa de vinho português era exportada para a Inglaterra, muitas vezes em troca de “salted cod”, conhecido em português como bacalhau.

O tratado comercial anglo-português de 1654 criou novas oportunidades para os comerciantes ingleses e escoceses que viviam em Portugal, permitindo-lhes privilégios especiais e direitos aduaneiros preferenciais. Naquela época, o centro do negócio do vinho não era o Porto, como mais tarde se tornou, mas a elegante cidade costeira de Viana do Castelo, cuja situação no amplo estuário do rio Lima a tornava um porto natural confiável.

Os mercadores importavam mercadorias como lã e tecidos de algodão da Inglaterra e exportavam grãos, frutas, azeite e o que era conhecido como “Portugal tinto”, o vinho leve e ácido produzido nas proximidades da verdejante região do Minho, especialmente em torno das cidades de Melgaço e Monção.

Peter Bearsley, cujo pai fundou a Taylor’s, foi um dos primeiros ingleses a viajar para o alto Douro. E, em meados de 1700, a sua família foi a primeira a comprar vinhas na região para a produção de vinho.

Na mesma altura, o primeiro-ministro de Portugal, Marquês de Pombal, começou a distinguir as vinhas com base na qualidade. Um século depois, a maior parte do Vinho do Porto era feita da forma que é hoje: de grande qualidade, fortificado e doce.

Como é produzido o Vinho do Porto

A base do Vinho do Porto é feita como qualquer outro vinho: as uvas são cultivadas, prensadas e fermentadas com levedura, que converte açúcares naturais em álcool.

Na produção de vinho fortificado, porém, há uma etapa adicional. Antes de todo o açúcar ser convertido em álcool, uma aguardente vínica neutra é introduzida no vinho. Este processo é conhecido como fortificação.

A aguardente neutra é comumente chamada de aguardente. A aguardente mata o fermento restante e interrompe o processo de fermentação, preservando parte do açúcar residual e resultando em perfis de seco a doce e teores alcoólicos mais elevados, normalmente entre 18% e 22% de álcool por volume (ABV). 

Onde o Vinho do Porto é feito

Produzido no Vale do Douro, em Portugal, tal como o Champagne só pode ser chamado assim se for da região de Champagne, na França, apenas os vinhos produzidos no Vale do Douro podem ser rotulados como Vinho do Porto. Além disto, todas as uvas devem ser cultivadas e processadas nesta região demarcada.

Os solos do Vale do Rio Douro são predominantemente xistosos e graníticos. A região está dividida em três zonas que se estendem de oeste para leste, abraçando o rio: Baixo Corgo, Cima Corgo e Douro Superior. A parte ocidental do vale possui um clima mediterrâneo que produz verões quentes e bastante chuva. No entanto, à medida que se avança para o interior em direção ao Douro Superior, o clima torna-se mais seco e árido.

As colinas íngremes exigiram a construção dos famosos terraços para o cultivo das vinhas, chamados de socalcos do Douro. Em razão da característica do terreno, o rendimento por videira é um dos mais baixos do mundo.

A região do Alto Douro Vinhateiro foi classificada pela UNESCO em 2001 como Patrimônio da Humanidade, pela influência humana no seu desenvolvimento.

As sub-regiões do Porto

O Vale do Rio Douro estende-se desde a vila de Barqueiros até perto da fronteira espanhola. A mais ocidental das três sub-regiões, Baixo Corgo, é a que mais chove e tem as temperaturas mais frescas. As uvas cultivadas no Baixo Corgo são amplamente utilizadas para vinhos do Porto Tawny e Ruby.

No Cima Corgo, que fica a leste do Baixo Corgo, a temperatura média é mais elevada e a precipitação não é tão prevalente. As uvas cultivadas são consideradas de melhor qualidade do que as cultivadas rio abaixo.

O Douro Superior, a sub-região mais oriental, tem o menor volume de produção de uva, em parte devido às suas corredeiras e à geografia desafiadora. A área é a mais quente e seca das três sub-regiões, mas produz algumas das melhores uvas.

As castas do Porto

Embora possam ser utilizadas mais de 60 castas para produzir o Porto à base de vinho tinto, a maioria das casas trabalha entre 5 e 7 variedades, sendo as principais a Touriga Nacional, a Tinta Roriz (Tempranillo), a Tinta Cão, a Tinta Barroca e a Touriga Franca

A Touriga Franca é a casta mais fácil de cultivar e, portanto, a mais plantada. A Touriga Nacional, embora seja a mais difícil de controlar na vinha, é vista como a mais atrativa e característica da região.

Já na produção do Porto Branco, são mais de 30 uvas que podem ser utilizadas, dentre estas Sercial, Codega, Malvasia Fina, Viosinho, Rabigato, Gouveio e Folgasão.

O IVDP é responsável por verificar se as vinhas estão adequadas para a produção de Vinho do Porto, sendo classificadas de acordo com as condições de solo, clima e viticultura. O método utilizado para classificação é único em Portugal e foi idealizado por Álvaro Moreira da Fonseca e aplicado pela primeira vez em 1947.

Características que influenciam a qualidade da uva, tais como localização, altitude, declive, exposição, abrigo, variedade, idade da videira, rendimento e densidade de plantio são identificadas em uma escala de pontos positivos e/ou negativos.

O sistema de pontuação é utilizado para atribuir autorizações (licenças) anuais para a produção de Vinho do Porto. Este é um indicador da quantidade de Vinho do Porto que pode ser produzido. Isto não só regula a qualidade do vinho, mas também garante que o mercado cumpra as leis da oferta e da procura.

Os estilos de Vinho do Porto

  • Vinho do Porto Ruby – ruby é o estilo de Vinho do Porto mais produzido e amplamente disponível, cujo nome deve-se à sua cor vermelha jovem e brilhante. Para muitas pessoas serve como uma introdução aos vinhos fortificados em geral.

A maioria dos produtores envelhece o Porto Ruby durante dois ou três anos em tanques de cimento ou aço para evitar a oxidação, mantendo as suas características frescas e frutadas. Como os vinhos são filtrados e por vezes pasteurizados antes do engarrafamento, os Portos Ruby não evoluem com o envelhecimento em garrafa. A compensação é que não contém sedimentos, por isso não necessitam de decantação.

  • Porto Reserva – uma mistura de vinhos de alta qualidade, muitas vezes envelhecidos um pouco mais do que um Ruby básico antes do engarrafamento, proporcionando um Porto rico e satisfatório. Um Reserva é um vinho que passou cerca de sete anos em madeira. Pode ter um excelente valor em comparação aos vinhos engarrafados com indicação de idade.
  • Porto Rosé – um dos estilos mais recentes do Douro, foi introduzido pela Croft em 2008. É elaborado de forma semelhante ao vinho rosé tradicional (com contato mínimo com a casca da uva, o que lhe confere uma tonalidade rosada). Ao contrário de outros Vinhos do Portos mais tradicionais, o Porto Rosé não é envelhecido.
  • Porto Tawny – submetido a um maior envelhecimento em pipas de carvalho usadas, é um vinho mais encorpado e aromático. O contato com a madeira permite tanto a evaporação como a oxidação, o que altera a cor dos vinhos. Eles apresentam uma tonalidade puxando mais para o acastanhado, ao invés de vermelhos brilhantes. A oxidação também incorpora sabores secundários de nozes e caramelo ao vinho.

Os Portos Tawny da mais alta qualidade são envelhecidos em madeira e rotulados com 10, 20, 30 ou mais de 40 anos. Já os Portos Tawny de colheita única são conhecidos como “Colheitas” e envelhecidos em madeira por um período mínimo de 7 anos.

  • Porto da Garrafeira – extremamente raro e sempre com designação Vintage, envelhece em madeira, mas também passa um mínimo de oito anos em garrafões de vidro. O processo de envelhecimento do vidro cria aromas e sabores distintos.
  • Porto Branco – feito exclusivamente de uvas brancas, pode ser encontrado nos estilos seco, meio seco e doce. É muito consumido como aperitivo e em Portugal em um drink popular: o Porto Tonic, feito com Porto branco, água tónica e um toque cítrico.
  • Late Bottled Vintage (LBV) – Dirk Niepoort chama o LBV de “irmão mais novo do Vintage”, já que a procedência das uvas e os métodos de vinificação são semelhantes. O Late Bottled Vintage é um vinho de uma única safra, sendo engarrafado de quatro a seis anos após sua colheita. Tradicionalmente, o vinho não é filtrado e precisa de seis a oito anos em garrafa antes de ser servido. 

Os LBV’s de novo estilo são filtrados antes do engarrafamento e não necessitam de mais maturação em garrafa. Eles podem ser servidos sem decantação. Os LBV’s não filtrados, rotulados como “Envelhecido em Garrafa”, também amadureceram na garrafa por um período mínimo de três anos.

  • Porto Vintage – os mais conceituados e desejados são produzidos a partir de uma única safra declarada, apenas em anos excepcionais. Os vinhos devem ser envelhecidos em barricas e engarrafados dois a três anos após a colheita. Estes vinhos podem envelhecer até 40 a 50 anos antes de estarem prontos para serem apreciados plenamente.

Quanto tempo um Porto Vintage precisa para amadurecer depende muito da safra, mas 10 anos é geralmente o período mínimo e 15 ou 20 podem ser necessários. Nos anos em que nenhuma colheita é declarada, muitas das grandes casas de Vinho do Porto produzem um engarrafamento de quinta única, com uma designação de Colheita anexada.

Algumas das casas mais notáveis de Vinho do Porto

A lista é extensa, mas, para facilitar a decisão de compra, os produtores Andresen, Dow’s, Ferreira, Fonseca, Graham’s, Kopke, Niepoort, Quinta do Noval, Taylor’s e Warre’s devem ser considerados.    

Como beber Vinho do Porto

Evite taças pequenas de licor e destilados. O ideal é servir em taça de Vinho do Porto tradicional ou em taça de vinho branco, que permitirá girar e aerar o vinho para que os aromas e sabores possam ser plenamente apreciados. 

A temperatura deve estar em torno dos 16°C e a garrafa deve estar bem armazenada, especialmente após aberta. Portanto, esqueça aquela garrafa do avô que está aberta há anos no armário da sala. A dose padrão é de 85ml. 

Puro ou em um saboroso drink, a versatilidade do Vinho do Porto proporciona uma experiência de consumo única e deliciosa. Alguns tipos de Porto também podem ser servidos com gelo e são a bebida perfeita para se degustar em um dia quente.

Após a garrafa ser aberta, caso não seja consumido em sua totalidade, o vinho deve ser mantido na adega (ou geladeira) na posição vertical.

Comidas que combinam com Vinho do Porto

O Vinho do Porto pode harmonizar com uma grande variedade de alimentos – doces ou salgados. 

  • Porto Ruby: por ser um vinho jovem, com doçura pronunciada e caráter frutado, o Porto Ruby combina muito bem com os sabores cremosos e amanteigados dos queijos Brie e Camembert. O Ruby também apresenta notas de chocolate, criando um vínculo com sobremesas à base dessa iguaria. Experimente harmonizar com chocolate amargo com frutas vermelhas, morangos ou café e mousse de chocolate.

No caso do chocolate, prefira os amargos, entre 40% e 80% de cacau. O ideal é evitar chocolate branco.

  • Porto Tawny e Colheita: o sabor se aproxima ao de nozes, amêndoas e outras frutas secas. A harmonização pode ser feita com Crème brulée, Panna Cotta de caramelo, torta de nozes, avelãs ou amêndoas, petit fours, sobremesas e biscoitos amanteigados, pêssegos frescos, rabanada e “doces de ovos”. Pato de Pequim, pato com laranja, lombo de cordeiro com molho agridoce, dentre alguns pratos da culinária chinesa, além de Foie Gras.

Se for harmonizar com queijo, a sugestão é um Gouda mais envelhecido. Seus sabores de caramelo criarão uma perfeita harmonia.

Experimente adicionar um toque de Colheita ao Expresso Martini. O drink ganhará uma dimensão inigualável. 

  • Porto Branco: os mais secos combinam com salmão defumado, frutas frescas, sorvete de baunilha ou creme, queijos curados (Manchego e Pecorino), azeitonas e pratos de frutos do mar que ajudem a elevar a acidez e as notas cítricas. Os doces acompanham gaspachos e combinações de frutas com embutidos, como melão com presunto cru. 

O Porto branco, de perfil mais leve e frutado, combina bem com os sabores picantes e salgados do Feta e do queijo de cabra. Gruyère também será uma ótima harmonização.

  • Porto LBV e Vintage – acompanham muito bem frutas secas, tais como figo, tâmara, damasco e nozes, além de queijos como Gorgonzola, Roquefort, Stilton, Serra da Estrela, Saint Agur e Bresse Bleu. Para os Portos Vintage mais velhos (40 anos ou mais), faça uma experiência com carnes de caça elaboradas com especiarias, Tarte Tatin e Strudel. 

Para fechar as harmonizações com “chave de ouro”, derreta por alguns segundos uma fatia de queijo azul num forno, adicione um pouco de Porto LBV e descubra o significado da felicidade. 

Fatos interessantes sobre o Vinho do Porto

  • A etiqueta inglesa dita que quando uma garrafa de Porto é passada à mesa, não deve servir-se a si próprio, mas sim à pessoa sentada à sua direita. Depois, você terá que passar a garrafa para a pessoa à sua esquerda que irá encher o seu copo.
  • Depois de décadas de envelhecimento do Vinho do Porto, a madeira das barricas é enviada para os EUA, Irlanda e Escócia para finalizar o envelhecimento do whisky e do bourbon.
  • O Vale do Douro, onde o Porto é produzido, é considerado uma das mais antigas regiões vitivinícolas regulamentadas do mundo. Chianti (1716), Tokaj (1737) e Porto (1756). 
  • No passado, os barris de vinho do Porto eram transportados no rio Douro em barcos específicos denominados “Rabelo” e foram construídos para resistir as fortes correntes do Vale do Douro até Vila Nova de Gaia. Hoje eles são opções de turismo.

Por Olavo Castanha

Olavo Castanha é formado em Marketing e atua no mercado de bens de consumo há 30 anos. Formado em Enogastronomia pela ICIF – Italian Culinary Institute for Foreigners e Sommelier pela Associação Brasileira de Sommeliers – SP, atualmente se prepara para a próxima fase da Court of Master Sommeliers Americas.

  • Texto publicado com autorização do autor.
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